Uma substância do veneno da aranha Parawixia bistrato, comum na América do Sul e típica da regiões de cerrado, pode combater a evolução do Mal de Alzheimer e de outras doenças degenerativas. A descoberta, feita por um grupo de pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) de Ribeirão Preto, não significa ainda a cura da "epidemia silenciosa", mas é considerada uma das mais significativas dos últimos 30 anos.
A molécula usada nos testes com ratos pelos professores Joaquim Coutinho-Netto, da Faculdade de Medicina, e Wagner Ferreira dos Santos, da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, foi isolada da peçonha da aranha pela doutorada Andréia Fontana. Chamada de Parawil
"Não é nada que cura totalmente, mas poderá diminuir a extensão da lesão", disse Santos. O professor, que estuda o uso prático de venenos naturais há 14 anos, disse que a aranha do estudo foi escolhida por ser ainda pouco pesquisada e por ter o hábito de caçar insetos paralisando a presa.
Segundo ele, paralisar o inseto indica, do ponto de vista molecular, que a aranha conseguiu interromper um composto químico, chamado glutamato, de agir como neurotransmissor – o que impediria um gafanhoto de saltar após a injeção do veneno, por exemplo. "Esse composto age de forma semelhante no nosso cérebro, mas quando o glutamato está em excesso, ele lesiona a célula, a ligação é que se o veneno pode paralisar o glutamato do inseto, ele também paralisaria essa substância no cérebro", afirmou Santos.
Nos testes laboratoriais, a molécula Parawixia 1 foi injetada de forma isolada e agiu como um aspirador do glutamato nas células com problemas – o efeito neuroprotetor foi divulgado este ano em duas publicações internacionais. A próxima etapa da pesquisa que será realizada pelos professores Leonardo Gobbo Neto e Norberto Lopes, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas, deve definir a estrutura da molécula para que ela possa ser patenteada e sintetizada.
BUROCRACIA
Os resultados sobre a parawixia 1 são fruto de dez anos de pesquisa, mas a descoberta pode ser perdida para laboratórios internacionais devido a burocracia interna. A molécula não pôde ser patenteada no país por causa da lei brasileira, que proíbe a patente de produto da biodiversidade nacional e, por isso, será preciso primeiro encontrar a estrutura da substância para que essa possa ser patenteada.
A falta de investimento também preocupa especialistas da área. Segundo Paulo Fernandes Formiguieri, médico assistente das disciplinas de clínica médica geral e geriatria do Hospital das Clínica de Ribeirão Preto (HC), o Brasil é considerado celeiro de pesquisas básicas – as que vão até a fase com animais – mas raramente consegue se chegar à pesquisa clínica.
A grande questão é que qualquer droga, até que se prove que é segura e eficaz, tem que passar por uma série de estudos, que levam de cinco a dez anos, e isso implica em dinheiro para desenvolver material de ponta", disse Formiguieri.
Para Santos, que já teve recursos para outra pesquisa promissora – a de um analgésico mais potente que a morfina, feito a partir do veneno de um tipo de vespa – negados, o medicamento para Alzheimer depende de critérios relativos de aprovação.
"Agora a universidade, a partir da reitoria, intensificou um escritório para agilizar patentes, vamos ver se vai dar certo", disse o professor.
fonte: O Progresso