terça-feira, 20 de maio de 2008

Pesquisa descobre que peçonha de aranha do cerrado pode barrar os efeitos do Mal de Alzheimer

Uma substância do veneno da aranha Parawixia bistrato, comum na América do Sul e típica da regiões de cerrado, pode combater a evolução do Mal de Alzheimer e de outras doenças degenerativas. A descoberta, feita por um grupo de pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) de Ribeirão Preto, não significa ainda a cura da "epidemia silenciosa", mas é considerada uma das mais significativas dos últimos 30 anos.

A molécula usada nos testes com ratos pelos professores Joaquim Coutinho-Netto, da Faculdade de Medicina, e Wagner Ferreira dos Santos, da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, foi isolada da peçonha da aranha pela doutorada Andréia Fontana. Chamada de Parawil 1, a molécula evitou a morte das células nervosas nas cobaias - ação inédita que nenhum medicamento disponível no mercado consegue realizar.

"Não é nada que cura totalmente, mas poderá diminuir a extensão da lesão", disse Santos. O professor, que estuda o uso prático de venenos naturais há 14 anos, disse que a aranha do estudo foi escolhida por ser ainda pouco pesquisada e por ter o hábito de caçar insetos paralisando a presa.

Segundo ele, paralisar o inseto indica, do ponto de vista molecular, que a aranha conseguiu interromper um composto químico, chamado glutamato, de agir como neurotransmissor – o que impediria um gafanhoto de saltar após a injeção do veneno, por exemplo. "Esse composto age de forma semelhante no nosso cérebro, mas quando o glutamato está em excesso, ele lesiona a célula, a ligação é que se o veneno pode paralisar o glutamato do inseto, ele também paralisaria essa substância no cérebro", afirmou Santos.

Nos testes laboratoriais, a molécula Parawixia 1 foi injetada de forma isolada e agiu como um aspirador do glutamato nas células com problemas – o efeito neuroprotetor foi divulgado este ano em duas publicações internacionais. A próxima etapa da pesquisa que será realizada pelos professores Leonardo Gobbo Neto e Norberto Lopes, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas, deve definir a estrutura da molécula para que ela possa ser patenteada e sintetizada.

BUROCRACIA

Os resultados sobre a parawixia 1 são fruto de dez anos de pesquisa, mas a descoberta pode ser perdida para laboratórios internacionais devido a burocracia interna. A molécula não pôde ser patenteada no país por causa da lei brasileira, que proíbe a patente de produto da biodiversidade nacional e, por isso, será preciso primeiro encontrar a estrutura da substância para que essa possa ser patenteada.

A falta de investimento também preocupa especialistas da área. Segundo Paulo Fernandes Formiguieri, médico assistente das disciplinas de clínica médica geral e geriatria do Hospital das Clínica de Ribeirão Preto (HC), o Brasil é considerado celeiro de pesquisas básicas – as que vão até a fase com animais – mas raramente consegue se chegar à pesquisa clínica.

A grande questão é que qualquer droga, até que se prove que é segura e eficaz, tem que passar por uma série de estudos, que levam de cinco a dez anos, e isso implica em dinheiro para desenvolver material de ponta", disse Formiguieri.

Para Santos, que já teve recursos para outra pesquisa promissora – a de um analgésico mais potente que a morfina, feito a partir do veneno de um tipo de vespa – negados, o medicamento para Alzheimer depende de critérios relativos de aprovação.

"Agora a universidade, a partir da reitoria, intensificou um escritório para agilizar patentes, vamos ver se vai dar certo", disse o professor.

fonte: O Progresso